Pneus ressolados ou recapados em caminhões e ônibus podem estar com os dias contados no Brasil. Isso porque o Projeto de Lei 3569/2024 propõe proibir o uso desse tipo de pneus em caminhões e ônibus nas vias públicas brasileiras.
Muito utilizado em todo o país, por conta da economia, esses pneus são os que são submetidos a um processo de reforma, com a substituição da banda de rodagem por uma nova, em um sistema industrial que não altera nenhuma outra parte do pneu, a não ser a banda de rodagem desgastada.
De acordo com o texto do projeto, os transportadores de cargas e passageiros serão obrigados a substituir todos os pneus recapados que estejam sendo usados em seus veículos por pneus novos, fabricados de acordo com as normas de segurança vigentes estabelecidas pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (INMETRO).
Se for aprovado, o motorista flagrado usando pneus recapados será multado em R$ 5.000 e deverá regularizar o veículo, com a substituição de todos os pneus “irregulares”. Além disso, o projeto prevê que as penalidades começam 180 dias após a conversão do texto em lei, o que é um tempo inferior ao tempo de vida de um pneu de caminhão.
Para o deputado, a medida visa a segurança das estradas. Na justificativa do projeto, o autor destaca que o uso de pneus recapados, apesar do custo mais baixo, aumenta o risco de acidentes nas rodovias.
“Essa economia representa um risco significativo para a segurança nas rodovias, visto que muitos acidentes são causados pelo desprendimento das bandas de rodagem, principalmente em caminhões, que circulam em alta velocidade e com carga pesada”, destacou o deputado federal José Augusto Rosa.
Ainda na justificativa, o autor do projeto cita que estudos indicam que uma das causas frequentes de acidentes envolvendo veículos de grande porte nas rodovias brasileiras é o uso de pneus ressolados, cujas bandas de rodagem tendem a se soltar com mais facilidade. Para ele, essas situações, além de colocar em risco a vida dos motoristas, passageiros e de terceiros que circulam pelas rodovias, geram elevados custos para o Estado em termos de saúde pública e manutenção de rodovias.
“A medida busca reduzir os índices de acidentes causados por falhas nos pneus, promovendo uma maior segurança e qualidade no transporte rodoviário”, diz o autor.
O Projeto de Lei foi apresentado na Câmara dos Deputados no último dia 16 de setembro, e ainda não tem prazo estabelecido para análise nas comissões e no plenário. Nas redes sociais, o deputado publicou um vídeo sobre o assunto, destacando que a medida visa pressionar o governo a zerar os impostos dos pneus novos, reduzindo custos para os caminhoneiros.
SOS Estradas
Em 2021, o coordenador do SOS Estradas, Rodolfo Rizzotto, disse é importante entender que o proprietário do veículo é responsável pelo risco que causa aos demais usuários das estradas. “Esse problema ocorre nas rodovias concedidas, mas também nas municipais, estaduais e federais, onde não necessariamente os “restos mortais desses pneus” são recolhidos regularmente. Já as concessionárias recolhem milhares de “jacarés” nas rodovias mensalmente. Agora, elas não são responsáveis pelas más condições dos pneus, pela negligência dos proprietários. Inclusive é bom lembrar que muitos caminhoneiros deixam esses pedaços e sequer param para recolher. Portanto, lavam as mãos da sua responsabilidade, colocando inclusive outros colegas em risco.”
Autor de livro sobre Recall, Rizzotto, disse ainda que é preciso investigar a qualidade dos pneus e da reforma dos mesmos. “São raros na nossa história os casos de recall de pneus e desconheço algum de pneus reformados”, frisou.
Na ocasião, o portal Estradas publicou matéria exclusiva na qual abordava o tema com depoimentos de vários condutores (caminhoneiros, motociclistas), que se envolveram em sinistros nas estradas brasileiras. Em uma das ocorrências, a esposa de um caminhoneiro filmava a viagem, quando flagrou a carcaça de pneu saindo de outra carreta, no sentido contrário, atingindo em cheio o para-brisa da carreta Volvo, que seu marido conduzia. A ocorrência foi registrada no Distrito de Formosa, em Macururé, na Bahia. Felizmente, não houve feridos, mas tanto a mulher quanto o caminhoneiro ficaram bastante assustados.
A reportagem ouviu vítimas, motoristas profissionais, especialistas de trânsito, concessionárias e empresas que fabricam e reformam pneus para veículos de carga, além do diretor-executivo da Associação Brasileira de Concessionária de Rodovias (ABCR). Veja mais detalhes clicando aqui.
Segundo o texto, o autor do PL 3569/24 revela desconhecimento sobre o tema e desconsidera a realidade do setor de transportes brasileiro, ameaçando diretamente a sustentabilidade e a competitividade das empresas, especialmente as de pequeno e médio porte.
A utilização de pneus reformados, regulamentada desde 2006 pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), segue padrões de segurança equivalentes aos dos pneus novos. A Portaria N° 433, de 2021, consolida esses requisitos técnicos, assegurando que processos como recapagem, recauchutagem e remoldagem sejam realizados de maneira segura e dentro das normas estabelecidas.
A proibição proposta pelo Projeto de Lei, portanto, caminha na contramão das práticas de ESG (a abordagem que avalia como uma corporação incorpora temas ambientais e sociais aos seus processos no âmbito Ambiental, Social e de Governança), tendo em vista que o processo de reforma de pneu utiliza cerca de 1/5 da matéria-prima necessária para a fabricação de um pneu novo e contribui significativamente para a economia de água e diminuição da contaminação do ar por meio de uma menor concentração de gases poluentes na atmosfera.
Ainda de acordo com o SETCERGS, a entidade tem como valor institucional o compromisso inadiável com a Segurança Viária e o ESG, e essa visão é promovida mediante diversas ações que visam oferecer uma avaliação detalhada e orientação para empresas de transporte de cargas, com foco na conformidade com a norma ISO 39001, o principal padrão global para gestão da segurança viária.
A reciclagem de pneus permite a economia de 578 milhões de litros de petróleo e evita a emissão de cerca de 520 mil toneladas de CO₂ anualmente, reforçando a importância desse processo para a preservação ambiental. Assim, proibir os pneus reformados contraria práticas globais de sustentabilidade e prejudica o transporte rodoviário de cargas, um dos pilares da economia brasileira.
Em nota, a Associação Brasileira da Reforma de Pneus também reiterou seu posicionamento pelo arquivamento do PL 3569/2024, visando garantir a segurança jurídica do setor de transporte e a continuidade de práticas sustentáveis e economicamente viáveis.
Conforme o comunicado, o SETCERGS atuará, por meio de suas assessorias especializadas, junto ao poder público, para articular ações que defendam os interesses das empresas do setor e buscar o arquivamento imediato do projeto proposto.
Fonte: Portal Estradas